domingo, 29 de abril de 2018


Hoje vou para escola de camisa encarnada
De sandália de couro pintada de amarelo
De calça branca com listras  goiabas
Estou para decidi se vou de turbante ou boné aba reta
Quando chegar,  vou questionar o que nos cabe  
Cabe-nos saber, da ciência, da filosofia e das artes
Do que acontece no mundo, das lutas e da atmosfera   
Da decodificação da palavra, da economia e da ideologia
O que na escola não nos cabe
 É a festa  do pai , da mãe,   da santa e do santo
A oração só se for gramatical
Decidir quem deve amar quem
ou lugar de alguém, também não convém
Hastear a bandeira do conhecimento,
Essa deve ser a moral da escola
Para que dirigido aprenda a ser dirigente.  

Alexandre Lucas  

quinta-feira, 26 de abril de 2018


Faço-me companhia para o café e a conversa
Porque as paredes não escutam nada
o profundo verso, o grito estrondoso
o choro e nem uma prosa de amor
A vontade que tenho é  de quebrar as paredes
Talvez as paredes precisem ficar inteiras
Para acolher a companhia.

Alexandre Lucas

quarta-feira, 25 de abril de 2018


Rasgo a espera
Antes que se rasgue o estômago
Nado  em pétalas de sonhos rasgados
De  aguas salgadas
E de  cada despedaço faço uma colagem árida
Esperando a chuva chegar.

Alexandre Lucas  

terça-feira, 24 de abril de 2018


A garrafa está cheia de café e de pouca paciência
Os trabalhos se acumulam e as ideias se multiplicam
As nuvens de ideias vão surgindo e vou tocando
Às vezes sai uma valsa, outras só barulho
Enquanto isso faz calor  para rimar: penso em amor
Em fazer amor, sem pontos, sem vírgulas, sem pudores
O café me deixa acesso,  como o desejo  e a luta
Intenso,  são também os  dias.

Alexandre Lucas   

segunda-feira, 23 de abril de 2018


Durante a noite posso desaparecer
Como as cartas  que em tempos difíceis nunca chegaram
Deixo algumas cartas, sem endereços ou destinatários   
Escrevi  e fui deixando no caminho, umas mais apressadas
Outras densas e confusas,
Elas estão espalhadas  num mapa rasgado e perdido
as palavras que elas contém vão  se encaixando  com os gestos
e se arranjando num baralho que nem sempre é possível jogar.

Alexandre Lucas


O prazer foi enxotado
Com vassouras de pelos de prego
Estava deitado, ereto e viajante
O prazer estava despido
Com os lábios entre os dentes
E olhos arregalados de gosto
O prazer deitou-se no silêncio
Murcho, vestido e ferido
e adormeceu.

Alexandre Lucas    

domingo, 22 de abril de 2018


A criança falava baixinho
Estou com fome, mãe  
E a mãe achava que era apenas uma frescura
Em tom mais alto a criança repete
Estou com fome, mãe!
E a mãe irritada diz: chega!
Não houve a terceira, a criança se calou  
Morreu de fome.

Alexandre Lucas   


Língua livre
Para discursar  o desejo  
Empunhar a bandeira da  liberdade
Manifestar a rebeldia
Acolher o afeto
Língua para gestar a palavra e temperar o gozo
Que não nos falte a  língua,   no banquete dos afetos
E na procissão pela vida. 

Alexandre Lucas   


Gosto de acordar com o carinho das palavras
Espreguiçado, com um tempo mais lento
Abrindo devagarzinho os olhos para sentir o gosto do dia   
Um café quentinho, uma companhia mesmo que distante
Pulei da rede sem nenhuma palavra,
Não tive tempo de esticar os braços
Nem me ver no espelho
Sair correndo com a xícara na mão
Com  café amargo, de muita água e pouco pó
Esqueci-me de desligar o acelerador
Nem sempre ele anda comigo.

Alexandre Lucas  

Escuto tiros e cachoros latindo
A rua faz barulho
Vejo pela brecha fumaça
Tento sair, não consigo abrir a porta
Estou preso
Fabricando monstros e celas


Alexandre Lucas

sexta-feira, 20 de abril de 2018


Hoje não tem poema
Porque não teve pão
A  correria foi companheira
E o desejo entalado
Todas as desculpas são argamassas
Para misturar palavras
E compor narrativas do duelo da vida  
Que se faz de amor e dor.

Alexandre Lucas  

quinta-feira, 19 de abril de 2018


Compor um poema
Com  sincera-mente
Ele já nasce
Mentirosamente.

Alexandre Lucas  

Pichei a geladeira do teu coração
Só para sentir vida
e catar umas palavras

Alexandre Lucas

sábado, 14 de abril de 2018


Nas noites  das mais variadas luas
Nos dias de sol e cinzento
No calor e no frio
Na correria capital
Na luta contra a subsistência
Além do arroz e feijão
Que não falte
Nós nus  (e vestidos)  
Compactuando pele,  suores  e assaltos afetivos
Tramando um desejo coletivo
composto de fartura e fraternidade.

Alexandre Lucas   

quinta-feira, 12 de abril de 2018


Meu pai tem uma perna
A outra é um pedaço de ferro que se faz perna
Nunca vi a outra perna de carne e osso do  meu pai
Pai tinha duas pernas
E eu nem existia
Mas se hoje pai tivesse duas pernas
E uma apartasse e bolasse no asfalto
Não comeria pipoca
Não sentaria no sofá
E não ficaria curioso para espiar a dor humana.

Alexandre Lucas

sábado, 7 de abril de 2018


Não peçam silêncio
Quando as bombas e os tiros se anunciam
Faz dor e nós gritamos
De tão  alto acordará os vizinhos, a América Latina, o mundo  
Nós nos importamos
Quando a  pimenta arde,
Quando o sangue se faz cachoeira
Quando a pele abre crateras
Quando o medo e o ódio querem se fazer morada
Quando a mentira dita infinitas vezes quer se fazer verdade
As bombas não calam, muito menos dispersam
Os tiros do passado são siameses dos de hoje     

E eles nunca mataram as ideias.

 

 

Alexandre Lucas

Madrugada de 08 de abril de 2018.



Nem BOstas, nem DEMônios , nem TUpelosCANOS  
Nem arrego,  nem desespero
Outros dias estão nascendo  
brotará foice e martelo, estrela  e sol
Canhões de flores,
bandeiras vermelhas, amarelas e brancas serão borboletas nas ruas
As bandeiras brasileiras terão o mastro multicolor do seu povo
Lulas, Manuelas e Boulos serão temperos dos sonhos  que não se prendem
O país  inundará de esperança
Seremos o formigueiro vermelho, mais denso e mais convicto
Espalhados e juntos, caminharemos
Para uma terra sem boi zebu.  

  Alexandre Lucas


Tem dias em que as lágrimas batem por dentro
Sacudindo   o tempo com rajadas de trovões  
Que a chuva da alma nunca fique presa nos céus
Caia chuva
Depois de você (chuva, lágrimas)
Forte broto da terra.

Alexandre Lucas    

terça-feira, 3 de abril de 2018


Em tempos de infláveis e patos amarelos
Verdes olivas batem continência para o atraso
Uma torcida corre com olhos vendados e ouvidos lacrados  
Empunham com a mão direita
Uma tocha, uma balança desmedida e um dicionário de mentiras
Nas escrituras da dor
Desconhecem:
Pau-de-arara
Choque elétrico
Pimentinha
 Afogamento
Cadeira do Dragão
Geladeira
Cobra
Barata
Banho chinês
Injeção de éter
Soro pentotal
Telefone
Sexo anal com cacetete
Fio no pênis e na rosa vagina
Dessaber
Um relatório para a história
Brasil Nunca Mais.

Alexandre Lucas   
   

segunda-feira, 2 de abril de 2018


Fazer pipoca
É juntar milhos,
Colocar para esquentar  
Esperar
Pouco a pouco cada milho  se avessa
Algumas pulam fora
Outras  queimam
A maioria parece ser igual
Apenas parecem
Enquanto faço pipoca
Penso como se esquenta uma ditadura.

Alexandre Lucas